Monday, June 7, 2010

O desafio da carteira de motorista


   Mais de 1 mês após nossa última conversa, estou feliz por voltar ao blog. No mês passado, pelo menos três situações mereciam ser contadas aqui: fui a um seminário de um cientista prêmio Nobel, no qual ele descreveu suas principais experiências ao longo de 60 anos de carreira (seminário espetacular, diga-se de passagem); fui a dois jogos de baseball (eita esporte engraçado); e finalmente, fui solicitar minha carteira de motorista. Como não está me sobrando muito tempo para “blogar”, escolhi escrever sobre o último acontecimento, pois este ficará marcado para o resto da minha vida como uma experiência um tanto traumatizante. Posso até dividir essa epopeia em quatro atos!

Primeiro Ato: Preparativos
   No final de abril/início de maio, eu visitei o website da divisão de veículos do estado da Carolina do Norte (DMV – NC; o equivalente ao nosso Detran) e baixei o Manual do Motorista. Neste, pude aprender os procedimentos para solicitar a carteira de motorista e todas as provas que deveria fazer. Boa notícia: não precisa pagar nada até finalizar todo o processo de solicitação da carteira. Má notícia: teria que fazer quatro provas, incluindo uma de sinais de trânsito e uma teórica e uma prática. Fiz uma busca na internet e li vários comentários de que a prova teórica era muito confusa e com questões dúbias. Sem falar que o aproveitamento mínimo deveria ser de 75% para ser aprovado (20 acertos em 25 questões). Ouvi também vários comentários de pessoas que haviam reprovado nessa prova, inclusive pessoas com experiência e anos de direção.

   Com o sinal amarelo aceso, iniciei a leitura do manual. Estudei pra valer e, relembrando o tempo de faculdade, cheguei até a escrever um resumo. Claro que alguns tópicos são universais: faixa de pedestre, linha amarela pontilhada ou contínua separando faixa, etc. Outros, no entanto, são diferentes e foram novidades pra mim. Por exemplo, se um ônibus escolar estiver parado, carregando ou descarregando passageiros, todos os carros que estiverem na mesma mão do ônibus, e também na contra-mão, são obrigados a parar até que o ônibus entre em movimento novamente. Infringir esse regulamento é a mais grave infração de trânsito do estado e caso um acidente fatal seja gerado por tal infração, o motorista responde por homicídio, com toda força do código penal norte-americano contra o cidadão.

   O capítulo de sinais de trânsito é um caso à parte. São diversos tipos de sinais, divididos em três categorias principais. Para fazer o teste de sinais de trânsito, é necessário saber não apenas significado de cada um deles, mas também conhecer o sinal pelo seu formato e cor.

Segundo Ato: Primeiros testes
   Após ter feito alguns simulados online, senti-me preparado para enfrentar as provas e fui ao escritório do DMV com todos os documentos necessários. Iniciei pelo exame de vista, seguido pelo de sinais e pela prova teórica. Exatamente como eu havia lido, algumas questões eram meio sem sentido, mas eu estava preparado e acertei as 20 questões já nas primeiras 21 perguntas. Agora eu já tinha um número de carteira de motorista, mas ainda faltava fazer a prova prática. Para isto, eu deveria retornar ao DMV na semana seguinte com um carro. Saí de lá bastante seguro, imaginando que a parte mais complicada já havia passado. Afinal, com 11 anos de carteira de habilitação no Brasil, dirigindo em cidades com trânsitos caóticos, não imaginaria que teria dificuldade na prova prática. Ledo engano...

Terceiro Ato: “You’re scaring me to death. Don’t do that crap!”
   Antes de ir ao DMV, eu estava na universidade, do lado de fora do prédio, esperando um amigo que iria me emprestar o carro para eu fazer o teste. Um dos professores chegou e me perguntou por que eu estava ali. Eu avisei o que iria fazer e ele comentou: “Se você for reprovado, não se assuste. Eu fui reprovado na primeira vez que fiz esse exame.” Este foi o primeiro sinal negativo.

   O DMV estava lotado quando eu cheguei. Enquanto aguardava a minha vez, percebi que se a pessoa voltasse da prova prática de direção (ou driving test) e fosse tirar a foto, é porque ela havia sido aprovada, caso contrário, a pessoa estava reprovada. Três pessoas antes de mim saíram para fazer essa prova e somente uma foi aprovada. Segundo sinal negativo.

   Quando fui chamado para o teste, a examinadora perguntou pelos meus documentos e pelo registro do carro. Eu entreguei os documentos e informei que havia deixado o registro no carro. Ela disse que não tinha problema, mas se eu precisasse fazer o teste novamente, eu deveria trazer o registro do carro comigo. Terceiro e último sinal negativo.

   Fomos para o carro, ela me explicou o que eu deveria fazer e falou que eu podia dar a partida no carro. Eu estava calmo, mas logo na primeira curva tomei uma bronca. A examinadora entendeu que eu ia entrar na highway (estrada) sem esperar os carros passarem (coisa que eu não ia!). Ela meio que gritou para eu parar o carro. Eu prontamente fiz e tive que ouvir: “Tem carros na pista, você não pode entrar assim!” Nessa hora, eu fiquei nervoso. Se tem uma coisa que é difícil de fazer é contra-argumentar em inglês numa situação de pressão. Limitei-me a pedir desculpas. Seguimos o teste e na curva seguinte, eu tomei outra bronca, numa situação semelhante. Foi aí que ouvi a frase que é o título desse ato. Em bom pernambuquês, a examinadora quis dizer “Você está me assustando que só a porra. Não faça esse tipo de merda!”. Não fazia nem 5 minutos que o exame havia iniciado e eu já sabia que tinha me lascado... O resto do teste foi só pra constar.

   O gosto da derrota é péssimo, principalmente quando se é responsável pelo seu próprio fracasso. Em nenhum dos momentos, eu ia avançar o carro de forma desordenada, mas também não tive capacidade de tentar explicar isso à examinadora. Talvez eu realmente tenha feito algo que a levou a entender que eu ia cometer aquelas infrações de trânsito. Como em situações de trauma, eu não me lembro direito do teste. Acho que relaxei após a prova teórica e este foi meu erro fatal. Saí do DMV arrasado, com vergonha de mim mesmo. Consegui ser reprovado em um exame fácil, se comparado ao que temos que fazer no Brasil.

Quarto Ato: Do silêncio à celebração
   Após mais de uma semana digerindo meu fracasso anterior, retornei ao DMV para fazer o teste novamente. Dessa vez, o escritório estava vazio e logo chegou a minha vez. Um examinador com cara de poucos amigos me atendeu. Tudo ocorreu tranquilamente, embora eu estivesse muito nervoso. Ao final do teste, o examinador começou a me explicar sobre mudança de faixas. Ele foi meio grosso e em seguida saiu do carro. Eu pensei que havia reprovado de novo.
   Já no escritório, o examinador não olhava pra mim e limitava-se a digitar coisas no computador. Ele ficou uns 5 minutos assim, sem pronunciar um balbucio sequer. Sabe quando os minutos ganham status de eternidade? Essa foi a sensação. Nem os minutos que antecederam o início da minha defesa de tese foram tão longos. Finalmente, ele me mostrou umas figuras, pediu que eu escolhesse uma para ser o fundo da minha carteira e informou-me que eu deveria pagar 4 dólares. Escolhi a imagem e paguei a taxa. Em momento algum ele me informou que eu havia sido aprovado. Mas dessa vez, eu tirei a fotografia.


2 comments:

  1. Lindo!
    Que bom que essa carteira de motorista saiu... Afinal, vc vai ter que me levar para conhecer vários lugares!

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  2. O fiote, só no Brasil que a sinalização de PARE nao é pare. Aqui é, vá de vagar e e não der merda vá em frente. Nos ISTEISTIS, PARE é PARE PORRRRRRAAAAAA. Parece que não sabe que STOP é PARE? Pois, é, mudando de pato pra ganso, fico feliz que os DOIDUIOS dos gringos lhe deram a LICENSE DRIVE, o pior que pode acontecer é você não parar no STOP. rsrsrsrsrsrs.
    Um grande abraço e torça para os Estados Unidos ganhar a copa do Mundo. Eles vão precisar de todo apoio. KKKKKKKKKK

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